Ou: um animal abandonado será sempre um animal abandonado; não se espere que olhe os outros como seus iguais. Não importa quem o feriu antes. Importam as feridas e a sua memória. Não se pode trazer um animal ferido para dentro de casa e esperar que ele aguarde tranquilamente a hora da refeição e da água fresca, a saída e o regresso do novo dono. O que é dado aos restantes animais não lhe basta. Ele precisa de muito mais e de muito menos, e com muito mais urgência. Por exempo, morrer de fome e de sede é o suficiente; se for garantia de que não volta a sentir o abandono, bastará.
Um animal ferido é sempre um animal à espera de ser ferido.
* Adélia Prado (2003), Com Licença Poética -- Antologia, Lisboa: Cotovia.