É muito mais grave. Ah, sei que estou de novo mexendo no perigoso e que deveria calar-me para mim mesma. Não se deve dizer que a esperança não e necessária, pois poderia vir a se transformar, já que sou fraca, em arma destruidora. E para ti mesmo, em arma utilitária de destruição.
Eu poderia não entender e tu poderias não entender que prescindir da esperança -- na verdade significa acção, e hoje. Não, não é destruidor, espera, deixa eu nos entender. Trata-se de assunto proibido não porque é ruim mas porque nós nos arriscamos.
Sei que se eu abandonar o que foi uma vida toda organizada pela esperança, sei que abandonar tudo isso -- em prol dessa coisa mais ampla que é estar vivo -- abandonar tudo isso dói como separar-se de um filho ainda não nascido. A esperança é um filho ainda não nascido, só prometido, e isso machuca.
Clarice Lispector (2000 [1964]), A Paixão segundo G. H., Lisboa: Relógio d'Água, p. 118.